C A S A V A Z I A
Rio de Janeiro, 2014
Cinco atores, uma casa, 24 horas. Chegue quando quiser, fique o quanto puder.
O espetáculo nasce de três motes fundamentais: a arquitetura espacial é a força motriz do processo; o espectador tem poder de efetivamente intervir sobre a cena e transformá-la radicalmente; e as narrativas autoficcionais dos atores e do público são o mote para a criação de uma dramaturgia sensorial em tempo real.
Durante o espetáculo, os convidados – é como chamamos nosso público – vivem uma jornada pela casa, numa rotina que perpassa ações cotidianas: cozinhar, comer, dormir, tomar banho e arrumar a casa. Mas essa suposta rotina é constantemente atravessada pelos materiais biográficos dos atores, que trazem à tona as histórias dos próprios convidados.
Enquanto se banha num chuveirão, uma atriz revive os banhos de cuia de sua infância no interior de Pernambuco, no Nordeste do Brasil. A memória não é sua, mas de uma convidada, que vê o próprio relato contado há pouco encenado como história de outra pessoa.
No quarto, instigados por atrizes, convidados brincam de gato-mia, aquele pique que as crianças brincam no escuro. Pouco a pouco, o jogo se transforma na reedição de um assédio sexual infantil.
Enquanto isso, na cozinha, outros tantos convidados preparam o jantar: a receita é decidida ali, na hora, a partir do que temos na geladeira.
C A S A V A Z I A é também um projeto de território.
Antes de cada edição, realizamos uma ocupação-residência com 48 a 120 horas de duração, aberta a artistas e moradores da comunidade local. Durante esse tempo, montamos a casa, realizamos ações no entorno e trabalhamos em cima de novos materiais.
Quando realizamos o projeto no bairro de Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro, trabalhávamos no trem, meio de transporte primeiro de muitos moradores da região. Em uma das ações, levamos para o vagão toalha, sanduíches, bolos, café, sucos e frutas e fizemos um café da manhã no chão do trem com passageiros que entravam e saíam. Em certo momento, um evangélico e um umbandista conversaram sobre tolerância religiosa.
Noutra manhã, pegamos o trem levando bolo, vela, balões, línguas de sogra e chapeuzinhos de aniversário. O objetivo era encontrar uma aniversariante. Encontramos Jessica e o vagão virou uma festa. Jessica recebeu presentes dos vendedores ambulantes e a viagem “passou voando”, de acordo com Estela, aposentada, que naquela manhã ia visitar o filho detido na Penitenciária de Bangu. Ela agradeceu por sair do trem melhor do que tinha embarcado.